[N.186 | 2025]

O pé de manga, Útero, Filha de artesã

Barbara Kariri

O pé de manga 

Eu plantei um pé de manga para o meu neto. O neto do meu neto chupa as mangas do pé de manga que eu plantei. As abelhas também degustam as mangas do pé de manga que eu plantei. Eu, o pé de manga, meu neto e as abelhas alimentamos a terra que sustenta as raízes da mangueira. As raízes da mangueira estão na terra e nos meus fios de cabelo que são a continuidade da minha avó.

Minha avó sou eu, só que abelha, terra, manga
e o silêncio!

Útero

Eu posso dizer que, sendo passarinhos, temos em comum a passagem por muitos úteros. A cada passagem, o ancestral fica mais forte, estamos presentes em toda parte, correndo no sangue da veia, na terra, árvores e estrelas. Estamos aqui há milhões de anos, estamos aqui quando o vento sopra e a água amansa a garganta. Estamos quando o curumim nasce e o tronco velho se transforma. Estamos aqui como o rio que acolhe peixes grandes e piabas ou a cachoeira com suas danças de fluxo desatinado. Estamos aqui porque estiveram. Assim estou.

Parteira é mãe de umbigo. Eterna conexão maternal do centro em direção às encruzilhadas do vivente.

Filha de artesã

Arrumada. Estou diante do espelho. Quando quase duvido da minha beleza, minha mãe grita:
– Você não foi feita, foi bordada.