[N.240]

Desejo de língua que não é da mãe

Laura Ferreira

Tenho duas filhas. Moramos na parte brasileira da Tríplice Fronteira entre Paraguai, Brasil e Argentina. Somos parte de uma paisagem linguística e cultural guarani, paraguaia, argentina, brasileira. Numas férias na Argentina, a mais velha fez amizade com um grupo de crianças que brincavam em um parquinho. Passou horas negociando sentidos para fazer parte das brincadeiras, enquanto sua irmã mais nova observava caladinha aquela linguagem incipiente. 

– “Glácias!”, a mais nova começou a dizer para o pessoal do comércio.

A mais velha estava animada com o futuro social promissor que se abriria com a possibilidade de que momentos de interação como este voltasse a acontecer nas próximas férias. Quando voltamos para casa, ela estava decidida a aprender espanhol e foi quando me dei conta de que, mesmo numa cidade como Foz do Iguaçu, não encontraria cursinhos de espanhol para crianças de 8 anos. Incrementei nosso acervo de livros infantis em espanhol e pesquisei músicas. Líamos, escutávamos e cantávamos. A gente era feliz em espanhol também. E deixei a história de curso pra lá. 

Quando mudamos temporariamente para uma capital, na grade da escola havia uma outra língua: o inglês. Língua intrusa. Quando a gente voltar para fronteira, na próxima reunião da escola, vou perguntar para os pais se o espanhol é, para seus filhos, também a língua de brincar nos parquinhos.