vibrato
como fosse a carne imenso
instrumento reverberando vozes que passam a ser
conhecidas quando iniciam existência
e se por insistência a garganta se abre
porque o útero se abre como se abrem
todas as certezas agora uma anedota
não seria estranho compreender parto, partida
tampouco a explosão dos urros, uivos, vaias
a cada movimento em que o quadril se espraia
como uma revolução, como um novo nome
e depois, todo dia, como os peitos vertendo leite
se a qualquer momento ouvem o choro da cria
cantoria
teria nome de mulher um pássaro a levar no bico
frutos aos filhos, preces por fartura e abrigo
sem raminho nas patas durante as tormentas
a negar ser mensageiro de terra à vista
o corpo delgado diante da paisagem imposta
seria todo ele goela, grito, forjada graça
(a pergunta crucial – você faz
ignora gesto, jeito, linguagem – ainda assim, você faz)
é claro que o pássaro canta
o cansaço, algum gozo, o desgaste e vez ou outra
um poema preso na glote